Por Edson Grandisoli*
Olhe ao seu redor. O que você vê neste momento?
Talvez a tela de um computador ou celular, ou até mesmo o papel onde foi impresso esse texto. Madeira, plásticos, metais? Você já se perguntou de onde vem tudo isso até chegar em você?
Na verdade, a resposta é bem simples: tudo isso veio do ambiente, ou se preferir, da natureza.
Todos os objetos que nos cercam, um dia, foram parte integrante do ambiente. A madeira que veio das florestas ou áreas plantadas; os plásticos originados do petróleo que fica no subsolo; os metais na forma ainda de minérios que formavam cadeias de montanhas em algum ponto do mundo.
Para termos acesso a toda essa riqueza natural, temos historicamente desprezado outra muito importante: a biodiversidade.
O modelo linear de economia, baseado no tripé extrair-produzir-desperdiçar, tem em sua base a superexploração dos recursos naturais e, para que isso aconteça, diferentes tipos de ambientes, e toda a vida que abrigam, devem simplesmente dar lugar à atividade humana com fins econômicos.
A floresta mais biodiversa do planeta, a Amazônia, deve abrir mão de sua biodiversidade, a fim de ceder espaço à mineração, exploração de madeira e pecuária. Os oceanos, ambiente igualmente biodiverso, sofrem com derramamentos de petróleo e com todo o plástico que chega a eles às toneladas diariamente. Os cerrados, e toda sua vida, deixam de existir para dar lugar a enormes monoculturas.
Cerca de 90% da perda de biodiversidade está relacionada, direta ou indiretamente, à extração e processamento de recursos naturais, segundo o estudo “O Imperativo da Natureza: Como a economia circular pode enfrentar a perda de biodiversidade”, realizado pela Fundação Ellen MacArthur, o qual ainda afirma que “no setor de alimentos, por exemplo, o desmatamento para a agricultura causa a perda de habitat, enquanto muitas práticas agrícolas convencionais resultam em poluição do ar e da água e na sobre-exploração dos recursos naturais. Na indústria, a produção e o processamento de matérias-primas emitem grandes quantidades de gases de efeito estufa (GEE) e outros poluentes.”
Por conta de nossas escolhas enquanto espécie, temos colocado outras milhares em processo de extinção. Os cientistas consideram que estamos vivendo a sexta extinção em massa da Terra, sendo que a atual tem relação direta com a atividade humana no planeta.
Talvez esse seja o grande desafio deste milênio, ou seja, como garantir desenvolvimento humano e conservação da biodiversidade? A economia circular nos fornece pistas e caminhos preciosos na busca por essa resposta.
A criação de processos que garantam o reaproveitamento de materiais que já estão em circulação é um dos pontos centrais da economia circular. Esse reaproveitamento nas linhas de montagem reduz a pressão de exploração nos ambientes naturais, colaborando com a conservação da biodiversidade.
A produção agroecológica tem se mostrado competente na geração de alimentos de qualidade aliada à conservação do patrimônio natural local, garantindo a segurança alimentar, o direito à vida e o respeito às culturas locais.
A inovação tecnológica e o design também têm papel fundamental no desenvolvimento de produtos que podem ter seus componentes reutilizados ou reciclados, bem como criar materiais alternativos que utilizem cada vez menos recursos naturais e que possam retornar à natureza como insumo.
Essas atividades já são parte integrante do modo de operação de diversas empresas no Brasil e no mundo. A pauta ESG (Environmental, Social e Governance) e o redirecionamento estratégico de investimentos colaboram diretamente no estímulo à criação de práticas que ainda – mas por pouco tempo – são chamadas de alternativas.
Dentro desse cenário de rápida transformação, vale destacar que a conservação da biodiversidade é fundamental para nossa sobrevivência, uma vez que todas as formas de vida têm papel fundamental no equilíbrio ambiental, o que garante o funcionamento de diversos serviços ecossistêmicos essenciais para todos nós, como ter água e ar de qualidade, por exemplo.
O relatório da Fundação Ellen MacArthur dá destaque à fundamental conservação da biodiversidade mundial, mas vale o destaque de que os processos associados à economia circular também possuem relação com a conservação de outra forma de diversidade: a sociodiversidade.
Quilombolas, indígenas de centenas de etnias, caboclos, caiçaras, ribeirinhos, seringueiros, entre outras dezenas de comunidades e povos tradicionais também são diariamente, e negativamente, afetados por nosso modelo econômico exploratório e poluidor. Preservar a sociobiodiversidade é urgente e a economia circular tem demonstrado seu potencial integrador nessa direção.