Instabilidade no preço do leite exige inovação por parte da indústria

Por Danilo Zorzan*

*Danilo Zorzan é diretor de Marketing da Tetra Pak Brasil

O leite está consolidado há muito tempo como um dos itens mais básicos da dieta dos brasileiros, sendo amplamente consumido em todas as regiões do país em sua forma pura e por meio de derivados. Apesar disso, a indústria nacional de lácteos tem passado por grandes instabilidades nos últimos anos, decorrentes sobretudo de efeitos da pandemia e outros movimentos macroeconômicos que têm impactado negativamente os hábitos de consumo de produtos lácteos no Brasil.

No último ano, o preço dos insumos para a produção do leite subiu significativamente, o que estreitou a margem dos produtores e os desencorajou a trabalhar com o produto. Os motivos para a alta incluem a desorganização das cadeias produtivas que resultou da COVID-19 e a guerra no Leste Europeu, que tem impactado o preço de fertilizantes, combustíveis e commodities agrícolas no mundo.

Com a queda na oferta, o leite e seus derivados encareceram significativamente, com uma alta acumulada que superou 60% em um ano – entre os meses de julho de 2021 e de 2022 –, tornando o produto um ícone da inflação no mercado alimentício. Naturalmente, os consumidores reagiram a este movimento por meio de suas escolhas nas gôndolas: segundo um estudo recém-publicado pela Mintel sobre o consumo de leite de vaca e leites alternativos no Brasil, 25% dos brasileiros estão consumindo menos leite este ano em comparação com 2021 e migrando para produtos mais baratos. É claro que este impacto é particularmente intenso entre classes com menor poder aquisitivo, que são mais vulneráveis às flutuações de preços.

Embora recentemente a alta de preços do leite tenha desacelerado, com o aumento na produção do campo em função da chegada do período de chuvas e a queda na demanda, o impacto negativo deixado pelo último ano no consumo do produto tende a continuar surtindo efeitos no curto prazo, demandando soluções inovadoras por parte da indústria de lácteos – tanto em termos de comunicação, com  um reforço os atributos nutricionais da categoria e sua adequação a diferentes momentos e situação de consumo, como em termos de diversificação de portfólio.

O estudo da Mintel aponta diferentes – e complementares – caminhos para a superação dos desafios pelos quais a indústria está passando. A aposta em leites vegetais seria um deles, mas precisaria ser dirigida e comunicada a uma parcela de consumidores das classes A e B que têm sustentabilidade e saudabilidade como prioridade, visto que são ainda mais caros que o leite de vaca tradicional (embora o encarecimento deste esteja encurtando a distância de preço das categorias). Leites saborizados são um caminho para a nutrição infantil, mas com preferência para produtos de rótulo limpo e saudáveis, visto que os pais estão cada vez mais críticos em relação aos produtos que oferecem aos seus filhos. Leites semidesnatados podem se apresentar e comunicar como opções que entregam saudabilidade sem perda de sabor, textura ou nutrientes.

Em resumo, inovar em portfólio é a chave, o que também passa por fabricantes ampliarem seus horizontes para além do leite puro, considerando desbravar segmentos com boa rentabilidade, tais como iogurtes, bebidas lácteas com alto teor de proteína, queijos e mais. Na Tetra Pak, já temos sentido o crescimento dessa busca por novos caminhos dentro do universo de produtos lácteos: no que diz respeito às embalagens, de 2018 para cá, registramos um crescimento de 36% no volume de embalagens vendidas para categorias novas e emergentes, que incluem queijo em caixinha, bebidas à base de whey protein, leites fermentados e mais.

Muitos são os caminhos, mas todos partem de uma certeza: a de que, em tempos de instabilidade e grandes oscilações de preço, a indústria de lácteos não pode ficar inerte e achar que sua segurança está dada pela tradição do leite. Os hábitos de consumo estão mudando e, para atendê-los, a indústria deve inovar, acompanhando as transformações, aproximando-se das novas demandas em termos tanto de produtos, com novas formulações e aposta em novas categorias, e de comunicação, reforçando os atributos dos produtos lácteos e sua relevância para as nossas dietas.

Em um cenário de recuperação econômica, estimado para daqui três a cinco anos, se navegarmos por essa instabilidade com consciência e fazendo as escolhas certas, tenho certeza de que teremos preços mais estáveis e mais espaço no mercado tanto para o leite de origem animal como para cada vez mais derivados e alternativas. Até lá, marcas devem aprimorar sua comunicação, apostar em novas categorias e formas de levar valor agregado para os consumidores, que estão cada vez mais informados, críticos e suscetíveis aos movimentos macroeconômicos.

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