Quando o simples surpreende: The Last Bookstore

Por Zeh Henrique Rodrigues*

*Zeh Henrique Rodrigues é diretor de Branding e
Varejo do Grupo OM / Brainbox

Não é fácil ser simples. Ainda mais atualmente, quando o excesso de informação dificulta o poder de decisão. As empresas se veem pressionadas a buscar soluções inovadoras, tecnológicas e disruptivas para permanecerem lucrativas e atraindo consumidores. No varejo não é diferente. Todos os dias vemos novidades ao mesmo tempo que testemunhamos a falência de diversas marcas. Qual o segredo? Existe uma bala de prata para se manter vivo como negócio?

Acredito que a resposta seja a simplicidade. Sob meu ponto de vista, essa virtude tem a ver com humildade, empatia e eficácia. Humildade para aguçar a percepção, empatia para identificar necessidades e eficácia para entregar resultados positivos com pragmatismo. Nessa perspectiva, os meios para se atingir a simplicidade podem ser diversos, do analógico à inteligência artificial.

Bem no centro de Los Angeles, achei um ótimo exemplo de execução simples com grande êxito: The Last Bookstore, a maior loja de livros e discos usados e novos da Califórnia. Sua história e fama não se comparam às gigantes Barnes & Noble e Waterstones ou às turísticas Lello e Acqua Alta. Porém, o que vi nessa livraria, fundada em 2005 e que ocupa um espaço peculiar em um edifício centenário que abrigava uma agência bancária, é um exemplo de autenticidade e pragmatismo.

Nada é refinado, nada é tecnológico, nada é forçado. Mas tudo o que um aficionado por livros e cultura quer está lá. Essa conexão com o público é o segredo da simplicidade. Pelo ambiente de mais de 2 mil m² e 250 mil títulos, existe uma loja de discos, uma loja de quadrinhos, cinco estúdios de arte e um pequeno café. Poltronas (não cadeiras) estão em ótima quantidade e bem distribuídas nos três andares de loja. As prateleiras são bem sinalizadas, existe um balcão de informações, além de uma equipe sempre circulando para dar assistência aos visitantes.

O mobiliário, a comunicação e o visual merchandising são simples. Madeira sem tratamento, certamente de segunda mão. As poltronas que comentei são bem velhas, gastas e com remendos visíveis. A sinalização é cartesiana. A linguagem da comunicação, franca e direta. Mesmo assim, o espaço consegue ser acolhedor. As pessoas sentem-se à vontade, circulando, lendo, tirando fotos, sentadas confortavelmente e, o mais importante, comprando. O ambiente é autêntico, se concentra no produto e não em distrações que não agregam nada. Diferente de muitas livrarias mais sofisticadas, por exemplo, não se vê leitores ajoelhados ou sentados no chão, pois existem assentos para todos. Simples, não?

Outro fator que faz dessa livraria uma aula de experiência são as microzonas em diversos ambientes. Seja um túnel, uma janela de livros ou uma sala dentro de um cofre, a loja é um convite para descobertas e encantamento, com uma boa dose de excentricidade. E funciona para todas as idades. Enquanto as crianças se divertem pelos labirintos de livros, os adultos podem fazer suas buscas por clássicos usados ou lançamentos.

O curioso é que, na contramão da maioria das livrarias conceituadas, o fundador da The Last Bookstore não é livreiro. Josh Spencer era um vendedor por essência, tendo passado pela venda carros até roupas online. Um belo dia, decidiu se concentrar em seu primeiro amor: livros. E está fazendo isso muito bem.

James Daunt, CEO da Barnes & Noble e da Waterstones, livreiro com mais de 30 anos de experiência, está fazendo grandes mudanças nessas empresas com o objetivo de voltar a trazer números positivos. Esse segmento vem sofrendo muito desde a entrada da amazon.com e dos e-books. Publicamente ele já declarou que a estratégia que está usando é tratar cada loja das redes como uma livraria independente. Por quê? Certamente para se livrar do peso institucional e das amarras dos escritórios centrais e conseguir se aproximar de quem mais interessa: os leitores.

Mesmo sem ter experiência no ramo, mas sendo bom vendedor, Josh Spencer entendeu desde o início que a conexão verdadeira com o público é a essência de qualquer negócio.

Relevância com simplicidade é sempre uma boa fórmula. Hoje, a The Last Bookstore é considerada uma das maiores livrarias independentes do mundo em funcionamento. O nome é pura ironia, uma mistura de brincadeira com provocação. Desafia o status quo da grande indústria, dos preços agressivos, do negócio a qualquer custo, da valorização das ações na bolsa. E faz isso com simplicidade, a única arma, eu diria, capaz de combater a incompetência generalizada que vemos com frequência nas marcas que se dizem grandes.

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